sábado, 20 de dezembro de 2008

A Força do Feitiço

A porta pedida há já algum tempo estava pronta e bonitinha. A São, a nossa fiel e imprescindível empregada, transbordava felicidade por finalmente ir ter uma porta na sua casa. Quando na quinta-feira de manhã cheguei à fazenda a primeira coisa que ela me disse foi que eu me tinha enganado na porta. No dia anterior, em vez de ter levado a porta que se destinava à casa da vila tinha levado a dela. Mas eu não tinha levado porta nenhuma no dia anterior… 1+1= a porta tinha sido roubada durante a noite.

Como foi? Quem terá sido? A conversa com os carpinteiros, os responsáveis pela carpintaria, foi inconclusiva quanto ao autor, mas deu para concluir que poderia ter sido qualquer um dos oitenta trabalhadores e que a porta não estava longe. Todos os que trabalharam no dia anterior estavam a trabalhar e como as respectivas casas ficam todas a mais de 10 Kms, não houve tempo de terem levado a porta a pé até casa e voltado na mesma noite.

Falou-se em reter os salários até a porta aparecer, os pagamentos seriam sexta-feira, ou descontar um tanto a cada um dos trabalhadores para pagar a porta à São, que representava uma quarta parte do salário mensal. Mas a São disse que não era preciso, ela própria ia tratar do assunto.

Ao fim do dia, quando o pessoal se reuniu todo para receber os cartões de ponto, entrou a São em acção. A uns minutos de discurso em Quimbumdo dirigido à plateia, seguiram-se mais alguns em Português em que disse mais ou menos isto…
- Vocês só sabem roubar e não vos basta roubar os brancos que não sabem fazer feitiço, agora também roubam os pretos? Desta vez se enganaram, a porta é minha, sou preta como vocês e sei fazer feitiço. Se a porta não aparecer ali a trás daquela madeira amanhã de manhã, vou fazer um feitiço para o ladrão morrer. Feitiço forte de morrer mesmo, não só de ficar doente. Eu sei, não custa nada. É só uma galinha que já pedi ao Tio Amândio e pouco mais. Já vos avisei.

Fez-se um silêncio sepulcral e lentamente retiraram, enquanto a São nos confidenciava que a porta ia aparecer.

No dia seguinte logo ao iniciar os trabalhos alguém encontrou a porta exactamente no local apontado pela São onde deveria ser colocada. Instalou-se de imediato uma alegria enorme com uma algazarra audível a vários Kms. Todos quiseram ajudar a trazer a porta até ao local de onde tinha sido roubada, ou pelo menos tocar-lhe. Pareceu ter ganho algo de sobrenatural.

- Eu não disse que a porta ia aparecer – Ia repetindo a São com um enorme sorriso estampado no rosto.

6 comentários:

Amélie disse...

eu gosto destas histórias! :)

Unknown disse...

Dava tanto jeitinho por aqui... saber uns feitiços :D

Beijos e saudadesssssssss

Amélie disse...

A música que mais gostei na festinha dos meninos, chama-se Natal Africano. Para ti.
http://br.youtube.com/watch?v=0PHXOtztGKQ

Lusbelo disse...

;-)

E então se fosse contada pelo Mia Couto com o seu jeito tão especial seria uma pérola.

Beijo

Lusbelo disse...

:-))))))))))

E onde não dava, Natacha?

*

Lusbelo disse...

:*

Há tanta criança africana a precisar de um Natal...

:-*