terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Os Chineses 3





25/01/09
A manhã começou luminosa mas não conseguia apagar a perspectiva de um domingo burro. Fim-de-semana sem nenhum acontecimento relacionado com o jet set cá do sítio ou sem futebol, outro acontecimento que também enche a vila de calulenses da diáspora, é sempre um domingo burro. (Burro em linguagem angolana é a classificação dada a tudo o que não presta.) Para matar a manhã tínhamos umas fotos programadas às obras do estádio. Para a tarde alguma coisa se arranjaria…

À chegada ao estádio estranhamos a falta de movimento. Ninguém nos postos de trabalho habituais sete dias por semana. Alguma coisa de muito estranho se passava. Já no interior tornaram-se perceptíveis vozes que chegavam de um dos anexos do estádio. Ocorreu-nos que talvez estivessem em reunião e fomos entrando um pouco a medo. Nada de reunião. Na camarata, que também serve de sala de refeições, chineses e angolanos conviviam à mesa com um registo de som das vozes exageradamente elevado, intercalada por sonoras gargalhadas, nada habitual nos dias de trabalho.
-Entrem, entrem – disseram lá de dentro logo que nos avistaram à porta. Alguns passos na direcção deles e já tinha nas mãos uma cerveja Cuca, natural, e dois cigarros AC.

Intrigadíssimos com aquela euforia tão latina em chineses conhecidos pelo seu modo reservado, ainda demoramos alguns minutos a conseguir perceber o que se passava. Era a comemoração da entrada do novo ano chinês. Sugeri umas fotografias para recordação. Aceitaram a sugestão com entusiasmo e o programa de sessão fotográfica às obras do estádio foi para o espaço. Pediram fotografias em grupo, sozinhos, com o chefe angolano, repetindo até à exaustão… Chefe bom, chefe amigo…

A partir daí foi só surfar a onda. Muita cerveja em brindes sucessivos, quando algum dos chineses bebia um golo sugeria um brinde em grupo ou a um dos presentes em particular. Nunca bebiam um golo sem a companhia de alguém e como todos faziam questão em oferecer também a sua cerveja, matéria prima para os brindes nunca faltou. Muitos cigarros recebidos directamente para o bolso, não fumo mas segredaram-me que não aceitar um cigarro quando nos é oferecido pode ser considerado uma ofensa, e muita comida chinesa. Detesto a comida chinesa que é fornecida nos restaurantes chineses da Europa, o que me fez aceitar com alguma relutância provar a comida quando me convidaram para lhes fazer companhia na refeição. Muita carne e legumes, tudo muito cortadinho, com um paladar ligeiramente diferente do da nossa cozinha mas sem nenhuma semelhança com o que se come nos restaurantes chineses. Gostei e não me fiquei pelo provar. Com algumas explicações ao fim de pouco tempo já conseguia apanhar na perfeição os pedacinhos mais pequenos com os talheres tradicionais chineses. Com linguagem gestual consegui perguntar por que não utilizam talheres Europeus e entender a resposta. Disse o meu interlocutor que trabalhar com pauzinhos obriga ao trabalho de todos os músculos do braço e de uma grande parte do cérebro, funcionando como um relaxante para a comida ter uma melhor digestão. Apesar dos nossos esforços não conseguimos saber qual o animal do novo ano chinês, mas saímos de lá muito mais ricos do que tínhamos entrado na capacidade de compreender os diferentes.