segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Excelsis.

É nestes dias de isolamento e solidão que tomo consciência da falta que os livros me fazem. Não que eu seja um leitor exemplar nem um devorador de livros, nada disso. Tenho todas as qualidades para ser um mau leitor. Mas gosto de os ter como companhia. Hoje, mais que noutros dias, senti saudades de recomeçar com novo entusiasmo a ler um livro abandonado a meio. De ir até ao escritório, olhar para a estante e escolher um para, muitas vezes, voltar a pôr no sítio depois de o sentir, cheirar e passar os olhos por alguns parágrafos aleatoriamente. Ou mesmo ter a liberdade de apenas olhar para eles, e não pegar em nenhum por opção. Tal como os bons amigos, sei que nunca serão passado. Estarão sempre disponíveis, numa espera sem tempo, quando os procurar.

Mas hoje não pude fazer nada disso. Com apenas treze livros na “estante”, já lidos e relidos, tomei consciência da importância daqueles gestos simples e quase inconscientes. Socorri-me do livro que por mais que seja lido, nunca estará lido, que me fez companhia durante o resto da tarde…

Fecho, cansado, as portas das minhas janelas, excluo o mundo e por um momento tenho a liberdade. Amanhã voltarei a ser escravo; porém agora, só, sem necessidade de ninguém, receoso apenas que alguma voz ou presença venha interromper-me, tenho a minha pequena liberdade, os meus momentos de excelsis.
Na cadeira, onde me recosto, esqueço a vida que me oprime. Não me dói senão ter-me doído
.

O livro do Desassossego, Bernardo Soares.

7 comentários:

Seagul disse...

E que essencial se torna a miúde, excluir o mundo e termos um bom encontro connosco mesmo...
Boa noite para quem está sempre comigo mesmo quando estou só comigo por ser a metade que me faz ficar completa.
Beijos.

Unknown disse...

Estante? Ouvi bem?? Tem estante??
HUMPF!! Sinto-me enganada... afinal vive rodeado de luxos... ;-))

Livros são uma óptima companhia :)

Beijos

Seagul disse...

E ainda:
Os direitos do leitor (Daniel Pennac)

O direito de não ler
O direito de pular páginas
O direito de não terminar um livro
O direito de reler
O direito de ler qualquer coisa
O direito ao bovarismo (doença textualmente transmissível)
O direito de ler em qualquer lugar
O direito de ler uma frase aqui e outra ali
O direito de ler em voz alta
O direito de calar

Beijinhos. Gina

Seagul disse...

E também este, de um Fernando para outro Fernando:

Ai que prazer
Não cumprir um dever,
Ter um livro para ler
E não o fazer!
Ler é maçada,
Estudar é nada.
O sol doira
Sem literatura.
O rio corre, bem ou mal,
Sem edição original.
E a brisa, essa,
De tão naturalmente matinal,
Como tem tempo não tem pressa...

Livros são papéis pintados com tinta.
Estudar é uma coisa em que está indistinta
A distinção entre nada e coisa nenhuma.

Quanto é melhor, quanto há bruma,
Esperar por D. Sebastião,
Quer venha ou não!

Grande é a poesia, a bondade e as danças...
Mas o melhor do mundo são as crianças,
Flores, música, o luar, e o sol, que peca
Só quando, em vez de criar, seca.

O mais que isto
É Jesus Cristo,
Que não sabia nada de finanças
Nem consta que tivesse biblioteca...

Mais beijinhos com saudades. Gina

Unknown disse...

Gina

"Liberdade" - Fernando Pessoa ...

AMO!!

Lusbelo disse...

Olá Seagul(Gina)!

Sem a eloquência do outro Fernando para poder responder como merecias, só me resta ler e emocionar-me...

Beijos

Lusbelo disse...

OLá Natacha!

Estante de livros sim senhor, estão melhor instalados que o dono, ;-)e mesmo pequenina é mesmo um luxo por ser a única em muitos Kms ao redor.

Beijos